Na segunda 15, o corregedor do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Luis Felipe Salomão, de maneira monocrática, afastou três ma
Na segunda 15, o corregedor do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Luis Felipe Salomão, de maneira monocrática, afastou três magistrados que atuaram na Lava-Jato.
Foi uma decisão estranha. As irregularidades supostamente cometidas ocorreram há anos; não havia processo disciplinar em curso; o assunto estava pautado para votação no CNJ no dia seguinte. Por que a precipitação? Talvez para garantir que a votação ocorresse de fato na data marcada, último dia de mandato de dois conselheiros com cujo apoio Salomão podia contar.
A decisão (revogada em parte pelo plenário do CNJ) foi mais um item na longa lista de medidas arrojadas e polêmicas tomadas pelo Judiciário. Dallagnol foi cassado por uma irregularidade que não está escrita em lugar nenhum. Moro foi considerado suspeito no STF com base em provas que não estavam nos autos e será julgado no TSE por um crime eleitoral que não está no código. Elon Musk está sendo investigado por delito de opinião, e até multa preventiva foi criada. Dezenas de pessoas (não se sabe quem) estão submetidas a censura prévia (não se sabe por quê) nas redes sociais.
A Lei das Estatais, aprovada por centenas de deputados e senadores eleitos, foi revogada pelo voto monocrático de uma pessoa não eleita. Multas já aceitas por J&F e Odebrecht foram suspensas sem fato novo. Pretende-se mudar o foro privilegiado em prejuízo dos parlamentares (o oposto do espírito da lei). Os exemplos são muitos.
O que há de especial na decisão de Salomão é que ela não foi tomada em tribunal superior. O hábito de avançar o sinal está fazendo escola. Era de esperar. “Ou restaure-se o respeito ao código de trânsito ou vamos todos meter o pé na tábua”, diria Stanislaw Ponte Preta.
“Medidas judiciais arrojadas demais ferem a própria democracia que pretendem defender”
Não surpreende que haja reação. Cada vez mais, o Congresso toma decisões não pelo mérito, mas para contrariar o Supremo. Foi assim com o marco temporal das terras indígenas, a prisão de Chiquinho Brazão, a decisão do Senado (na contramão do mundo, da ciência, do bom senso) de endurecer a lei das drogas. O confronto pode levar ao impasse.
Preocupado com a animosidade do Congresso, o STF fez reunião com o Executivo, buscando maneira de blindar a Corte. Seria preferível, talvez, avaliar internamente eventuais excessos cometidos e depois se reunir com o Legislativo para pacificar o ambiente.
A democracia correu grave perigo e o STF tomou medidas emergenciais para defendê-la e à Constituição, como é sua obrigação. A pátria agradece. Mas, se o risco não desapareceu, a emergência passou. Medidas judiciais arrojadas demais ferem a própria democracia que pretendem defender. E dão argumentos para aqueles que pretendem de fato destruí-la.
Para merecer “o direito de errar por último” e enterrar a disputa com o Congresso, o STF não precisa de blindagem, mas de maior moderação, característica dos tempos democráticos. Sem ela, continuará a ser visto como ator político, no mesmo nível de todos. E sujeito ao mesmo vale-tudo.
Para o bem de todos, e de si próprio, o STF precisa voltar a ser o Supremo.
Publicado em VEJA de 19 de abril de 2024, edição nº 2889