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O investimento de Stuhlberger para ganhar juros reais ‘insanos’

Em evento realizado pela Hedge Investments no final de março, Luis Stuhlberger destacou o “juro real insano” que estava sendo oferecido pelos tít

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  • Em evento realizado pela Hedge Investments no final de março, Luis Stuhlberger destacou o “juro real insano” que estava sendo oferecido pelos títulos de inflação do Tesouro Direto
  • Na abertura da sessão desta quarta-feira (17), os títulos IPCA+ disponíveis para compra pelo Tesouro Direto ofereciam retornos entre 6,07% a 6,10% ao ano, acima das rentabilidades observadas na sessão anterior. A volatilidade das taxas chegou a provocar uma interrupção das negociações durante algumas horas desta manhã
  • Apesar de representar uma grande oportunidade aos investidores, o patamar de rentabilidade de 6% de juro real ao ano em um título público é um marco atípico, normalmente atingido em tempos de “crise”. Saiba os riscos desse título público

Luis Stuhlberger, da Verde Asset, está de olho em um ativo de renda fixa. Em evento realizado pela Hedge Investments no dia 20 de março, o famoso gestor destacou o “juro real insano” que estava sendo oferecido pelos títulos de inflação do Tesouro Direto, especialmente aqueles com vencimentos mais longos.

As “NTN-Bs” ou “Tesouro IPCA+” são um dos papéis emitidos pelo Tesouro Nacional para financiar a dívida pública do governo junto a investidores. Esses ativos pagam além da variação da inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), uma rentabilidade prefixada anual acima dessa inflação – o tal do “juro real”.

No final de março, quando Stuhlberger evidenciou este ativo, tanto os títulos do Tesouro IPCA+ com o vencimento mais curto (para 2029) quanto aqueles com vencimentos mais longos (2045 e 2055) estavam encostando em 6% de rentabilidade real ao ano – entretanto, ainda não haviam superado a marca.

“Qualquer conta de matemática elementar diz o seguinte: se o Brasil tiver até 2060 um juro desse tamanho, o País quebrou no caminho. Não dá para chegar em um juro desse, é uma oportunidade imensa”, disse Stuhlberger durante o evento.

Só que de lá para cá, as taxas avançaram ainda mais. Na última terça-feira (16), os seis títulos IPCA+ disponíveis para compra pelo Tesouro Direto, com vencimentos entre 2029 e 2055, passaram a oferecer retornos reais de mais de 6% (entre 6,02% e 6,06%). Na abertura da sessão desta quarta-feira (17), as taxas avançaram ainda mais, para rentabilidades reais entre 6,07% a 6,10% ao ano.

A escalada dos prêmios fez com que a plataforma do Tesouro tivesse que interromper as negociações dos prefixados e IPCA+ nesta manhã. As compras e vendas só voltaram às 11h56, com os títulos apresentando juros menores do que na abertura, similares às taxas observadas na sessão de terça.


Os especialistas consultados pelo E-Investidor concordam com Stuhlberger e também enxergam o Tesouro IPCA+ como uma grande oportunidade de compra no momento. “Olhando o histórico de taxas de juros reais no Brasil, retorno real de 6% é considerado pico de alta, é um momento oportuno para investir. E ainda mais falando de Tesouro Direto, que são os ativos considerados livres de risco”, afirma Simone Albertoni, especialista em renda fixa na Ágora Investimentos.

Essa também é a visão de Rodrigo Caetano, analista da Toro Investimentos, e de Marilia Fontes, sócia-fundadora da Nord Research . “Os títulos IPCA + com taxas reais de 6% são uma ótima oportunidade de alocação para os investidores”, aponta Caetano. “Realmente são taxas muito altas”, ressalta Fontes.

Juro de “crise”

Apesar de representar uma grande oportunidade aos investidores, o patamar de rentabilidade de 6% de juro real ao ano em um título público é um marco atípico, normalmente atingido em tempos de “crise” ou “estresse econômico” no País.

Isto porque quanto maior a desconfiança dos investidores em relação à capacidade do Governo de pagar suas obrigações financeiras no futuro, mais prêmio esses investidores exigem para financiar a dívida pública. É essa dinâmica, de aversão a risco, que joga as rentabilidades dos títulos públicos para o alto.

De acordo com levantamento feito pela Quantum Finance, a pedido do E-Investidor, nos últimos 10 anos (2014 a 2024), em média, os títulos de inflação permaneceram com rendimentos reais iguais ou acima de 6% ao ano em menos de 25% das sessões. E claro, com alguns períodos de “jejum”.


Segundo dados do Tesouro Direto, entre 2017 e 2018, os títulos IPCA+ sem pagamento de juros semestrais só superaram esse patamar de juro real três vezes. Duas delas foram nos dias 18 e 19 de maio de 2017, logo após o “Joesley Day” (17 de maio). Naquele dia, vieram à tona conversas entre o empresário envolvido em corrupção Joesley Batista, da JBS, e o então presidente da República, Michel Temer (MDB), sobre a compra do “silêncio” do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha. A delação derrubou a Bolsa e fez o dólar disparar, com a possibilidade de que Temer fosse submetido a um impeachment, assim como sua antecessora, Dilma Rousseff (PT).

A terceira vez ocorreu em 25 de setembro de 2018, dia em que foi divulgada uma pesquisa que mostrava o então candidato à presidência, Jair Bolsonaro, estagnado nas pesquisas eleitorais e com rejeição crescendo. Depois disso, os títulos públicos de inflação só voltaram ao a atingir o pico de 6% de juro real com uma frequência um pouco maior a partir de junho de 2022, após a pandemia de Covid-19.

Ainda assim, em 2024, o Tesouro IPCA+ com vencimento mais longo, para 2055 e com juros semestrais, só pôde ser comprado com rentabilidade real igual ou superior a 6% no Tesouro Direto em três dias (11, 15 e 16 deste mês). Já o mais curto, para 2029 e sem juros semestrais, superou os 6% pela primeira vez no ano na última terça (16).

Incertezas no Brasil e nos EUA

Para Albertoni, da Ágora Investimentos, o que levou as taxas a superarem os 6% de juro real nos últimos dias foi a junção dos riscos externos e internos. Lá fora, os EUA mantém desde julho do ano passado uma taxa de juros entre 5,25% e 5,5% ao ano, a maior em mais de duas décadas, e ainda sem previsão de cortes devido aos dados econômicos ainda desfavoráveis.

A inflação americana continua acelerando além das estimativas, enquanto a atividade econômica segue sem sinais de esfriamento, o que limita a atuação do Federal Reserve (Fed, banco central americano). Com isso, os títulos do Tesouro Americano estão com rendimentos maiores, na esteira da perspectiva de juros mais altos no País – e essa conjuntura pesa também sobre as expectativas sobre os juros no mercado brasileiro.

“Nem o nosso último resultado do IPCA em março, que veio abaixo das expectativas, ajudou a segurar a abertura da curva de juros (aumento das expectativas para os juros futuros do Brasil)”, diz Albertoni.

Por outro lado, o cenário fiscal do Brasil contribui para a percepção de um risco maior por parte dos investidores e aumento das expectativas para os juros no futuro. No início da semana, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), confirmou uma mudança na meta fiscal estabelecida no Arcabouço para o ano que vem. Agora, em vez de superávit (quando as receitas do Governo superiores às despesas) de 0,5%, o objetivo vai ser de déficit zero.

“O segundo fator que explica a alta dos rendimentos do Tesouro IPCA+ é a nossa questão fiscal. A nossa incapacidade de lidar com o problema fiscal e realizar os cortes de gastos que seriam necessários para a gente ter um equilíbrio e um superávit”, diz Fontes, da Nord.

Caetano, da Toro, também tem esse entendimento. “As questões fiscais no Brasil ainda apresentam efeitos negativos na precificação dos títulos, fazendo com que as taxas, principalmente, as de longo prazo permaneçam em níveis elevados.

Risco do Tesouro IPCA+

Os títulos públicos são considerados os investimentos de menor risco do mercado, já que são emitidos pelo Governo. Ou seja, a chance de calote é mínimo em comparação aos demais ativos de renda fixa, garantidos por bancos, e renda variável, lastreados em empresas. Entretanto, não significa que não há chance de ter prejuízo.

Os títulos de inflação, assim como os prefixados, são sujeitos a efeitos de “marcação a mercado”. Em outras palavras, caso o investidor compre um Tesouro IPCA+ com vencimento para 2045 e decida retirar o dinheiro antes desta data, terá que vender o papel no mercado secundário, se submetendo a regras de oferta e demanda. Se aquele título oferecer um rendimento real atrativo, com rentabilidade acima do que está sendo oferecido pelo Tesouro no momento da transação, poderá ser vendido com lucro. Se não, poderá haver deságio.

Por isso, os títulos de inflação e prefixados costumam se valorizar quando a perspectiva é de queda na Selic e se desvalorizar quando a expectativa é de alta. Portanto, o maior risco do Tesouro IPCA+ é justamente a possibilidade de prejuízo para resgates antes do vencimento, caso haja um aumento das perspectivas para os juros.

“Se o governo continuar a fazer besteira fiscal, certamente essas taxas vão continuar subindo e os investidores terão marcação a mercado negativa”, diz Fontes, da Ágora. Já Albertoni, da Ágora, vê uma volatilidade maior somente no curto prazo. “A tendência de longo prazo é de queda, pois estamos em um cenário de corte de juros”, diz.

Ainda assim, não é indicado uma exposição de todo o patrimônio ao Tesouro IPCA+. Fontes, da Nord, indica uma alocação de até 30% do capital para investidores com perfil moderado, enquanto Caetano, da Toro, indica uma alocação de até 30% para investidores arrojados. Já a Ágora reforça que a recomendação de compra para títulos atrelados à inflação são para investidores que possam levar o papel até o vencimento. A preferência é pelo Tesouro IPCA+2029, que tem o vencimento mais curto disponível.

“Reiteramos que a nossa sugestão é manter o título até o vencimento, sendo que se não for essa a estratégia de investimento, a alocação somente em Tesouro Selic deve ser analisada”, diz a Ágora, em relatório. Vale lembrar que, desde janeiro do ano passado, os investidores podem acompanhar diariamente a variação dos preços dos títulos públicos. Entenda mais sobre marcação a mercado nesta reportagem.

Fonte: Externa