Crédito de carbono do mangue e capa para fruta: projetos do ensino médio brasileiro competem nos EUA

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Crédito de carbono do mangue e capa para fruta: projetos do ensino médio brasileiro competem nos EUA

A iniciação científica não é só para universitários e é isso que mostram alunos do ensino médio finalistas da Feira Brasileira de Ciências e Engenhari

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A iniciação científica não é só para universitários e é isso que mostram alunos do ensino médio finalistas da Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace), um programa de talentos que estimula a inovação. Os nove finalistas da feira brasileira vão agora competir internacionalmente, na Califórnia, Estados Unidos.

Dentre os diferentes temas pesquisados, apareceram com frequência aqueles relacionados à sustentabilidade e à biodiversidade do País.

  • Grande parte dos trabalhos finalistas da feira estava alinhada aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU e busca soluções para problemas complexos que afligem o planeta e as comunidades em que os estudantes estão inseridos.

Gabriel Ruediger, aluno do Colégio Visconde de Porto Seguro, na capital paulista, escolheu desenvolver uma iniciativa para preservar os manguezais brasileiros, identificando uma oportunidade de gerar o que chamou de “lucro sustentável” por meio do mercado de carbono azul, isto é, o carbono sequestrado e armazenado pelos ecossistemas costeiros e marinhos.

O seu projeto intitulado Calcula-Mangue é um protocolo para avaliar o estoque de carbono em manguezais, tomando como referência a Reserva Biológica Estadual de Guaratiba, no Estado do Rio de Janeiro.

Projeto intitulado Calcula-Mangue é um protocolo para avaliar o estoque de carbono em manguezais Foto: Taba Benedicto/Estadão

Como resultado, o estudante confirmou a sua hipótese de que há como converter o carbono armazenado nos mangues em uma fonte de renda sustentável. “Estimei o lucro sustentável da região alcançando quase R$ 3 milhões com carbono azul”, conta, enfatizando a importância de preservar os mangues brasileiros.

“Observei que há um novo ambiente que está sendo criado que é o mercado de carbono, em que se tem uma indústria que está emitindo CO2 e quer compensar aquilo de forma que não afete sua produtividade. Então ela investe através de crédito de carbono em regiões que preservam o meio ambiente simplesmente por fazer fotossíntese e sequestrar e armazenar esse carbono na terra”, explica Gabriel.

Ele decidiu focar em outro ecossistema que não a Amazônia: “Quando você pensa em desmatamento, você pensa em Amazônia, mas não lembra que tem uma composição tão complexa quanto os manguezais nacionais, e o Brasil é o segundo país com maior abundância desse ecossistema no mundo inteiro”.

Para isso, o estudante precisou ir muito além dos conhecimentos e habilidades adquiridos em sala de aula, aprendendo cálculos que não são ensinados no ensino médio e usando imagens de satélite e habilidades de programação para construir um algoritmo próprio.

O estudante desenvolveu ainda uma cartilha de informações que pretende distribuir de forma gratuita para ONGs, museus e embaixadas.

Estudante precisou ir muito além dos conhecimentos e habilidades adquiridos em sala de aula, aprendendo cálculos que não são ensinados no ensino médio Foto: Taba Benedicto/Estadão

Frutas

Durante o terceiro ano do ensino médio na Escola Estadual Luiz Girão, em Maranguape, no Ceará, Gabrielle Rodrigues realizou uma pesquisa comprovando que é possível produzir um revestimento comestível à base de mandacaru e cera de carnaúba para aumentar o “tempo de prateleira” de frutas e hortaliças.

A escolha pelo mandacaru e pela cera de carnaúba se deu em função de serem espécies em abundância no Ceará, e a mistura dos dois resultou em um conservante saudável, biodegradável, sustentável e que mantém as características dos frutos, como a cor, o sabor, a textura e o odor – diferente dos revestimentos comuns no mercado, geralmente feitos de parafina, que “fazem mal à saúde”, segundo a estudante.

A motivação de Gabrielle veio pelo interesse na questão do desperdício de alimentos e do combate à fome. “30% dos alimentos produzidos no mundo são desperdiçados. Então, eu decidi criar esse revestimento como alternativa para minimizar esses problemas na cadeia produtiva de alimentos, principalmente de frutas e de hortaliças”, conta.

A história de Gabrielle se assemelha com a de Ana Rebeka Monteiro, também aluna de uma escola estadual no Ceará, a Escola Marconi Coelho Reis, na cidade de Cascavel. As duas estudantes desenvolveram suas pesquisas no laboratório de escolas estaduais e faziam um contraturno após as aulas para estudar e desenvolver seus trabalhos.

Ana Rebeka também teve a ideia de desenvolver um revestimento, mas o seu foi feito com a casca da beterraba. “Lemos em alguns artigos que as cascas de beterraba são pouco utilizadas, porém são ricas e compostos bioativos”, conta.

“Então fiz a coleta de casca de beterraba e retirei um extrato, que usei para produzir o meu polímero. Depois que o meu polímero fermentou, triturei ele com o resíduo do extrato da casca da beterraba. E isso dá origem ao meu revestimento”, completa. O conservante custa apenas 28 centavos a cada 200 gramas.

A estudante queria produzir um composto que substituísse agroquímicos e que fosse de baixo custo para ser usado pelos agricultores familiares de sua região.

“A maioria dos pais dos alunos da minha escola trabalham com agricultura, então a gente fez uma visita a esses agricultores nas hortas e apresentou o projeto. Fizemos um workshop ensinando como produzir esse revestimento, já que é tão simples. Foi um contato muito legal porque fomos capazes de impactar a vida desses agricultores socialmente, que era o objetivo desde o início”, diz Ana Rebeka.

As duas pesquisas feitas pelas alunas impactaram em suas escolhas de profissão. Ambas escolheram cursar Engenharia de Alimentos.

“Eu gostei muito do tema de conservação de alimentos e para levar essa pesquisa para a universidade eu teria que entrar em um curso de Engenharia de Alimentos, então foi isso que eu fiz. Estudei, fiz o vestibular e entrei na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Vou ingressar no segundo semestre deste ano e estou muito animada para continuar com a minha pesquisa”, relata Gabrielle.

“Eu tive um contato direto com os laboratórios da universidade e vi que realmente o que eu queria trabalhar no futuro e o que eu realmente gostava de fazer era a área da pesquisa”, diz Ana Rebeka.

Agora, Gabrielle, Ana Rebeka e Gabriel se preparam para representar o Brasil e competir com mais de 1.600 projetos de diversos países na International Science and Engineering Fair (ISEF), a feira internacional de ciências e engenharia, que acontece no próximo mês. Os finalistas da ISEF concorrem a quase US$ 9 milhões em prêmios e bolsas de estudo.

Fonte: Externa